Entrevista

Marcia Pires, pesquisadora de ciência de polímeros da Braskem
    polímero inteligente

    O conceito de polímero inteligente é único

    A Interpack, realizada em Düsseldorf (Alemanha) entre 4 e 10 de maio, é a maior feira mundial de embalagens. Como tal, é um tradicional palco para a apresentação de novidades para o setor. A Braskem, maior produtora de resinas termoplásticas das Américas, esteve presente com um estande, onde recebeu parceiros e clientes de diferentes países. Além de ter apresentado conceito e aplicações das resinas de polipropileno e de polietileno verde, produzida a partir da cana de açúcar, a empresa destacou-se ao divulgar os resultados de uma pesquisa na área de polímeros inteligentes, estudo que marca um passo importante no desenvolvimento de resinas que usam indicadores para comunicar, por exemplo, informações como a deterioração de alimentos através da mudança de cor.

    Realizada pelo corpo técnico da Braskem, em conjunto com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e a Universidade de Clemson, dos Estados Unidos, a pesquisa já apresentou bons resultados em laboratório.

    Marcia Pires, pesquisadora de ciência de polímeros da Braskem, conversou na Interpack com a reportagem de Let's Talk Packaging. Na entrevista, ela fala sobre o estágio do projeto, os próximos passos e as oportunidades que essa inovação abre.

    Explique, por favor, o que é esse projeto da Braskem
    Trata-se do desenvolvimento de um polímero inteligente. A ideia é que os polímeros possam comunicar alguma informação através da mudança de cor. Estamos no início do desenvolvimento, mas já conseguimos resultados concretos em laboratório. Escolhemos desenvolver um polímero que mudasse de cor para indicar o estado de conservação de alimentos, através da variação de pH. Alguns alimentos, à medida em que perdem qualidade, eliminam compostos que podem ser detectados pela embalagem. Os resultados que obtivemos em laboratório, utilizando elementos que permitem simular a variação de pH, mostram que é possível conseguir essa mudança de cor usando poliolefinas.

    E como isso funciona?
    A tecnologia é baseada em um indicador protegido, que é adicionado à poliolefina durante a produção, no momento de formar o grão final. É como se fosse um aditivo. Esse indicador é o que vai fazer a mudança de cor acontecer. Então, dependendo do gatilho que se precisa detectar, escolhe-se um indicador específico. A tecnologia tem muita versatilidade. Ela pode proteger outros indicadores além daqueles que testamos em laboratório. 

    Qual o papel dessa proteção ao indicador incorporado à resina?
    Nossa tecnologia é a combinação da formulação de polímero e da proteção do indicador. Se não houvesse proteção, o indicador poderia se deteriorar no processo de transformação. A resina vira filme, vira embalagem, mas o indicador precisa funcionar lá na frente, para reagir adequadamente aos gatilhos definidos.

    E quais são esses gatilhos?
    Mapeamos o pH. Sabemos que existem outros gatilhos e isso depende de cada produto, mas hoje isso ainda não está no escopo do projeto. Agora, a tecnologia precisa ser otimizada para avaliarmos a mudança de cor no contato com o produto, e essa otimização depende muito de definirmos qual vai ser o produto-alvo. Pode-se pensar em vários produtos, alimentos e não alimentos. Identificando o produto piloto e um parceiro para continuar com o desenvolvimento, vamos definir o gatilho, o indicador e dar sequência ao projeto.

    Pode-se dizer, então, que o próximo passo é mais comercial do que técnico?
    Eu diria que é mais uma decisão estratégica, para que então possamos nos voltar para a parte técnica com um caminho definido. Hoje fazemos o desenvolvimento com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul e com a Universidade de Clemson, nos Estados Unidos, junto com o corpo técnico da Braskem. A maior parte dos resultados que temos hoje, a produção do polímero inteligente e o desenvolvimento de protótipos, foi tudo feito no laboratório da Braskem. Estamos em busca de um parceiro que ajude na definição do produto alvo para avançar com o projeto.

    A Braskem está buscando uma parceria com uma marca, que manteria exclusividade no uso do produto por algum tempo, ou o desenvolvimento pode ser feito para um produto específico, ou mesmo para uma categoria inteira?
    Hoje não tem nada definido. Vamos avaliar quem está interessado, para então tomarmos uma decisão. Queremos uma parceria estratégica. A questão de volume não é o nosso foco de decisão. O primeiro cliente não vai criar volume suficiente para viabilizar o projeto sozinho. Ele precisa ser uma porta de entrada. Lógico que ajuda se ele tiver capacidade de criar escala. Seria, por exemplo, o caso de uma empresa multinacional que pode adotar o polímero inteligente em outras plantas, ou o de uma empresa que pode levar a tecnologia de um segmento para outro. Primeiro vamos ver quem são os interessados, para então avaliar estrategicamente que caminho é o mais indicado. Não estamos escolhendo nome, nem tamanho de mercado. Queremos um parceiro estratégico.

    Mas a ideia é fechar em um produto específico, correto?
    Isso não está definido. A maior possibilidade é que seja assim, para concentrar a pesquisa. Seria mais rápido.

    Essa solução pode ser utilizada em qualquer polímero, em qualquer processo de transformação?
    Pode ser em qualquer produto nosso. Nos fósseis, no PE Verde... Pode ser usado em injeção, sopro, termoformagem, embalagens flexíveis... Mas essa definição também está dentro daquele conceito de concentrar recursos. Vai depender muito de onde encontraremos oportunidade.

    A tecnologia desenvolvida pela Braskem é a única solução desse tipo no mundo?
    Que nós tenhamos mapeado, nenhuma petroquímica teve a mesma abordagem, de buscar um polímero que mude de cor com a alteração da qualidade do produto. Existem os rótulos, que são uma tecnologia diferente. Mas baseado em polímeros, não encontramos nada. O que já vimos são copos que mudam de cor em contato com água gelada, por exemplo. Não temos informação de que existam outros polímeros inteligentes.

    Qual o horizonte de tempo trabalhado pela Braskem para que esse produto se torne comercial?
    Esse é um projeto de longo prazo. Vai depender, naturalmente, de como vai evoluir o próximo passo. Quando definirmos o produto com que iremos trabalhar como piloto teremos uma ideia do ponto em que partiremos da tecnologia atual. Veremos se partimos de onde estamos hoje ou se será preciso voltar algum passo. O tempo, então, depende de como vai caminhar o desenvolvimento.

    Onde a Braskem enxerga as oportunidades para esse tipo de aplicação?
    Hoje, acreditamos muito nesse tipo de solução pela questão da segurança de alimento, não apenas para alertar o consumidor final, mas também no próprio controle interno da indústria, evitando que um produto impróprio siga adiante na produção. Olhamos também a questão da confiança de marca. Demonstrar essa preocupação com o consumidor pode ajudar as marcas a terem uma boa percepção.

    E como está sendo o envolvimento dos demais elos da cadeia produtiva nesse projeto?
    Estamos trazendo os demais agentes para a discussão agora. Ainda é um estágio inicial. Até agora o projeto estava sendo focado no desenvolvimento da tecnologia. Aqui na Interpack é que o estamos tornando público, apresentando o conceito ao mercado. O objetivo é conseguir envolver todos os potenciais interessados.

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    TAGS: conhecimento, conhecimento técnico, centros de pesquisa, estudo, inteligência, pesquisa, tecnologia, inovação, inovação colaborativa, colaboração, cooperação, tendências, futuro, mercado, embalagens inteligentes, polietileno, polipropileno, rígidas, flexíveis, resinas, parcerias, proteção

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